Que a pandemia trouxe muitos problemas e muitas dores para o mundo isso é certo. Agora, uma coisa que talvez nem todos tenham percebido é que ela provocou uma escassez de componentes eletrônicos que impactou fortemente a fabricação de dispositivos. Portanto, neste post falarei brevemente sobre esse assunto.

Ressalvas

Meu objetivo é explicar de forma resumida as motivações, os impactos e perspectivas acerca da escassez de componentes eletrônicos que ocorreu nos últimos anos (e ainda não está 100% normalizada). Eu não sou especialista e não tenho conhecimentos aprofundados sobre cadeia de suprimentos e fabricação de semicondutores, então utilize as informações aqui apenas para entendimento básico do tema.

A ideia deste post é servir de base para o post em que explico sobre o reaproveitamento de componentes a partir de sucatas.

A escassez de componentes

Origem do problema

Em 2020, no início da pandemia, foram adotadas medidas para impedir a proliferação do COVID-19, como o lockdown. Esta medida exigia que todas as pessoas ficassem confinadas em casa e só saíssem para atividades essenciais. Na prática, essa medida não foi seguida por algumas pessoas, mas grandes indústrias de fabricação de semicondutores seguiram.

O fato disso ter ocorrido gerou, naturalmente, um atraso nos processos fabris. O agravante aqui é que a fabricação de semicondutores por si só é demorada, podendo gastar de semanas à meses para fabricar um lote de um determinado componente. Além disso, a pandemia também levou muitas empresas a adotarem o regime de trabalho remoto, que por sua vez, fez aumentar a demanda por dispositivos eletrônicos.

Ou seja, as fabricantes de semicondutores tiveram um atraso no processo produtivo e logo depois um aumento significativo na demanda. Com uma alta demanda e uma oferta baixa, teve início, então, a escassez dos componentes eletrônicos.

A fabricação de partes eletrônicas muitas vezes envolve fornecedores em vários países e regiões. O relacionamento da cadeia de suprimentos global é intrincado, incluindo o fornecimento de matéria-prima, fabricação de componentes, montagem e outros elos. Por conta disso, outros fatores contribuíram com a escassez, como a guerra na Ucrânia e a guerra comercial entre Estados Unidos e China.

Empresas atingidas

Mesmo que um lote fabricado contemple muitos componentes, é só você lembrar que um único modelo de smartphone (exemplo), que tem dezenas de milhares de unidades vendidas, faz uso de dezenas de Circuitos Integrados diferentes. E, claro, existem inúmeras fabricantes de smartphones, TVs, desktops, notebooks, tablets e outros dispositivos eletrônicos. Todas elas, neste período, competiram indiretamente e diretamente pela aquisição de peças.

O mercado automobilístico foi bem afetado por essa crise, bem como o mercado de eletrônicos de consumo. Alguns exemplos de empresas foram: Sony (com a venda do PS5), Nvidia (com a venda de placas de vídeo), HP e Nintendo (com a venda do Switch).

Impactos negativos

Dentre os impactos negativos causados pela escassez de componentes estão (além da indisponibilidade):

  • Aumento do preço dos semicondutores:
    • Negativo também para quem apenas queria desenvolver projetos pessoais.
  • Aumento do preço de dispositivos eletrônicos:
    • Isso não foi causado só pelo aumento de preço dos semicondutores, mas também pela demanda maior que a oferta (efeito dominó por assim dizer).
  • Aumento de peças falsificadas: com as peças originais em falta e empresas desesperadas atrás de partes eletrônicas, isso abriu margem para pessoas mal intencionadas venderem CIs falsificados com maior facilidade.
    • Aqui estou me referindo especificamente à venda por meio de lojas “não oficiais” de componentes, como o Aliexpress.

Tudo isso fez com que os projetistas tivessem que adaptar o hardware ou até redesenhá-lo para acomodar componentes alternativos que não eram ideais, mas que “tampavam o buraco”.

Como estão as coisas agora

Após pouco mais de 3 anos do início da pandemia (2023 data em que escrevo este post), o cenário está mais agradável, mas ainda um pouco longe do fim.

Em janeiro deste ano, a Sony anunciou que a escassez finalmente acabou em relação à fabricação do PS5. E ainda em agosto de 2022, a Nvidia já estava vencendo a batalha da falta de peças.

De acordo com uma sondagem feita em Maio pela Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), 43% das empresas entrevistadas que usam semicondutores relataram ter dificuldades na aquisição deles. Em abril de 2022, esse número chegava a 78%.

Destas empresas, 12% esperavam ter atingido normalidade ainda no 1º semestre de 2023, 36% esperam regularizar no 2º semestre e 33% esperam isso acontecer só a partir de 2024. Os outros 19% estão sem previsão.

Tendo isto em vista, a perspectiva é de que as coisas vão se resolver 100% apenas em algum momento de 2024 ou 2025.

Leia a sondagem da Abinee para mais detalhes.

Soluções para evitar ou amenizar o problema

Adiante está um compilado, que foi fornecido pela distribuidora de componentes Win Source, com medidas que podem ajudar a amenizar o problema da indisponibilidade de componentes eletrônicos:

  • Investir na fabricação: aumentar investimentos em pesquisa e desenvolvimento e melhorar a capacidade e eficiência de fabricação de componentes eletrônicos. Introduzir processos e materiais avançados para reduzir a dependência de materiais escassos e melhorar a sustentabilidade da cadeia de suprimentos;
  • Diversificar a cadeia de suprimentos e reduzir a dependência de regiões ou empresas específicas: estabelecer um sistema global de cadeia de suprimentos, permitindo que a empresa se adapte às mudanças geopolíticas de maneira mais flexível, melhorando assim a resiliência e garantindo a continuidade e segurança das cadeias de suprimentos diante de desastres globais;
  • Fortalecer a previsão da demanda de mercado e a gestão de estoques: utilizar análise de dados e algoritmos avançados para melhorar a precisão da previsão da demanda e evitar excesso de estoque ou falta de suprimento. Otimizar estratégias de gestão de estoques para alcançar uma operação eficiente da cadeia de suprimentos;
  • Aplicar políticas governamentais: que apoiem o desenvolvimento coordenado de indústrias e incentivem o desenvolvimento e a inovação independente de indústrias locais. Reforçar a orientação de políticas, promover a atualização tecnológica e o aprimoramento da capacidade de produção da indústria de fabricação de componentes eletrônicos e reduzir a dependência de componentes importados.

Fontes: Wikipedia; Produza; Abinee.